domingo, março 13, 2011

Anselmo Borges no Encontro de Filosofia: “Os crimes e os horrores infligidos às vítimas inocentes postulam a necessidade, no plano moral, da existência de Deus”

A intervenção de Anselmo Borges  no 25.º Encontro de Filosofia (“Existência e Morte”), organizado pela Associação de Professores de Filosofia, que ontem teve lugar no Hotel D. Luís, em Coimbra, despertou vivo interesse junto dos participantes, como se verificou pelo debate muito animado que se seguiu. O que fica aqui escrito são apenas notas pessoais ou como disse alguém “questões de reflexão para um retiro nesta quaresma”, sem pretensões de constituir um qualquer resumo.
 Começou por referir que ninguém sabe o que é morrer. Suscitou a necessidade de desconstruir determinadas crenças e suposições, tais como “o meu ente querido está aqui morto; “vamos levá-lo à última morada”ou “vou levar flores ao meu pai”…Infelizmente, na última morada ou no cemitério, além dos vivos,   está um amontoado de ossos e nada mais. Nos cemitérios está sim uma pergunta: afinal o que é o homem? O que é isso de ser homem?
Neste tempo do culto da juventude e da beleza e da vivência de uma racionalidade instrumental em que sobressai a razão funcional, a morte é tabu.  Existe a morte dos outros, ninguém pode conceber-se morto. A morte que pensamos é a dos outros. Cada um considera-se imortal. Mas o que sobra é uma felicidade sem eternidade e sem horizontes de futuro. Sobre a morte não temos qualquer poder. A morte põe-nos em confronto com o limite, com o nada.
Afirmou ser favorável a uma reflexão sadia sobre a morte para que o tempo seja vivido “com textura”, pondo em causa “esta correria louca”.  Do postulado “a morte é o impensável que obriga a pensar” decorrerá a necessidade de o ser humano  fazer escolhas no decurso da vida (de horizonte limitado). Nesta sequência, questionou a possibilidade da existência da religião e da ética, caso não houvesse morte.
Após referir vários paradoxos relacionados com a morte, perguntou se a mesma constituía o fim, o nada enquanto termo de tudo, como “uma vela que se apaga”. Nesta sequência e/ou em alternativa apontou as atitudes e as respostas possíveis perante a morte: i) o silêncio; ii) a indiferença; iii) a reencarnação; a iv) a sobrevivência pelos filhos, pelos actos e pelas obras e v) a esperança e a abertura para o infinito, núcleo de todas as religiões, e para o acolhimento em Deus criador, como opção com razões. Esta possibilidade funda-se em razão do amor e não para justificar o fracasso da morte. O amor a sério  requer  a continuidade da vida. “Esperamos que o amor tenha a última palavra e não a morte definitiva”, referiu.  A propósito, partilhou o seu espanto pelo   facto de os judeus terem acreditado em Deus ao longo de milhares de anos e só no século II antes de Cristo terem intuído a crença na ressurreição dos mortos, porque aqueles que  morreram  por Deus não podem ser condenados à morte.